quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Violino


Na alma do meu violino
estão guardados os meus sentimentos
um coração de poeta
e alguns outros inventos.

Apoiadas em seu cavalete
as cordas são como telas
onde os dedos pintam cores
de melodias singelas.

Seu estandarte não porta bandeiras,
brasões, doutrina ou país;
a música não tem fronteiras,
a emoção é o seu verniz.

Na queixeira descanso o rosto
como quem deseja dormir;
as arcadas são movimentadas
pelo meu mais puro sentir.

Gentilmente torço as cravelhas,
afinando uma nova canção,
indo a todas as orelhas
que se abrem ao meu coração.

domingo, 28 de abril de 2019

Gente humilde

Outro dia estava conversando com um primo meu que está trabalhando em um emprego que eu considero muito estressante. Perguntei a ele se estava gostando do novo emprego e a resposta veio acompanhada de um suspiro e um sorriso desconcertado: "tenho que gostar, né".
Fiquei um pouco sem graça com a minha falta de sensibilidade e tentei remedar dizendo que o importante era ter o emprego, que gente chata tem em qualquer lugar e essas coisas. Depois que nos despedimos, pensei várias vezes nesse episódio e resolvi escrever um pouco das coisas que têm passado pela minha cabeça.
Eu sempre vi uma diferença entre a minha vida e a vida de muitos dos meus primos. Eu pude estudar em escola particular, emendei o ensino médio na faculdade, fiz intercâmbio e estou na pós-graduação. A necessidade de começar a ganhar algum dinheiro surgiu em mim durante a faculdade, não por uma demanda externa, mas porque eu queria não precisar pedir dinheiro aos meus pais cada vez que quisesse comprar um chiclete. Mais tarde eu vi esta situação se alterar um pouco, claro, mas mesmo me sentindo um pouco mais responsável pelos custos da minha casa e por ajudar meus pais, minha contribuição ainda não chega a ser algo imprescindível.
A maioria dos meus primos estudou em escola pública, formou no ensino médio (alguns nem formaram) e nem tentou entrar na universidade. Muitos dos meus primos começaram a trabalhar durante a adolescência, quando isso ainda nem passava pela minha cabeça. Vendendo picolé, trabalhando em lanchonetes, em casas de família - nenhum trabalho que fosse algo que eles realmente se sentissem empolgados fazendo. Mas isso não quer dizer, por outro lado, que eles tivessem algum problema com isso - é a lógica do "é importante ter um emprego, não importa se não é tão divertido". A maioria deles está casada e tem filhos, e o dinheiro que eles ganham não é importante apenas para eles, já que têm responsabilidade sobre uma casa e as pessoas que nela habitam.
Eu nunca gostei da associação que as pessoas fazem entre pouco dinheiro e humildade. Sempre achei que alguém pode ser rico e humilde ou pobre e arrogante. No entanto, percebo que em certos aspectos a falta de dinheiro exercita ao menos um tipo de humildade: saber que algo é necessário, que não depende só da minha vontade, uma certa resiliência. Eu me permito recusar trabalhos que eu não considero tão bem remunerados ou muito chatos. Um primo que tem três crianças em casa para alimentar não tem a mesma forma de pensamento que eu: em tempos de desemprego, qualquer oferta de trabalho é recebida com um sorriso.
Pensar sobre isso me fez sentir um pouquinho de vergonha sobre todas as vezes que eu reclamei por trabalhar e estudar ao mesmo tempo, ou por ter que fazer algo que eu não gostasse para ganhar dinheiro. Isso porque trabalhar nestas situações, para mim, estava relacionado a algum objetivo muito pessoal meu. No caso dos meus primos, trabalhar significa conseguir viver, se alimentar, comprar roupa pros filhos. O que nos move é bastante diferente. Pensando de uma forma cínica, poderíamos dizer que ambos os lados escolheram aceitar ou não os empregos, ou escolheram as razões pelas quais vale a pena trabalhar. Para mim, todavia, parece injusto comparar alguém que junta dinheiro para tirar a carteira de motorista com alguém que conta com o salário de todo mês para alimentar os filhos.
Eu não invejo a situação deste meu primo. Eu gostaria que ele pudesse encontrar um emprego bem melhor do que ele tem agora. A nossa conversa, porém, me fez desejar ter um pouco desta humildade de quem vê a vida de uma forma mais prática e imediata, sem se sentir um coitado por isso - e que fique claro aqui: eu acho sim que uma pessoa que trabalha pra conseguir um salário mínimo e tem que aceitar um trabalho super estressante é, sim, uma vítima de um sistema que, embora naturalizado pela nossa sociedade, é horrível e violento.  Ou seja, se ele se sentisse uma vítima, não acho que ele estaria errado, apenas estaria menos feliz. Porque, no fim das contas, este sentimento de injustiça por si só não o permitiria recusar o emprego, nem deixar de pagar as contas, e provavelmente ele só ficaria mais deprimido com toda a situação. É melhor que eu sinta esta indignação por ele, já que eu não tenho filhos pra criar nem estou, no momento, obrigada a trabalhar em algo que eu detesto.

quinta-feira, 28 de março de 2019

Alienação intelectualizada

Quando uma pessoa não é bem informada e consciente da sua situação e da situação da sociedade em que vive é logo rotulada de alienada. No entanto, vivemos em um mar de informações, muitas falsas, outras distorcidas, e mesmo as verdadeiras se repetem desnecessariamente numa quantidade absurda, e este mar de informação acaba nos afogando e nos alienando de alguma forma.
Durante o almoço, não sinto o gosto do que estou comendo porque estou olhando o celular. No percurso do ônibus, mal vejo o caminho por onde passo porque estou lendo algum artigo aleatório. Em qualquer minuto de espera - ou na realidade em qualquer segundo de espera - o gesto automático da maioria das pessoas ao meu redor é o de deslizar o dedo pela tela do celular, "alimentando-se" em algum dos feeds - seja do Facebook ou do Instagram, "comendo" a indignação ou a felicidade alheia, e indignando-se ou se alegrando (talvez invejando) com o que está na tela, mas ignorando a lua cheia no céu ou o mendigo deitado na calçada ao seu lado. Pego o celular: uma notificação. Dois minutos depois, pego o celular de novo: não há notificações. Quatro minutos depois: não há notificações. Cinco minutos depois: não há notificações, eu já deveria saber, mas insisto neste gesto automático de pegar o celular como se qualquer minuto de consciência do mundo real/presente fosse insuportável.
Mas não há apenas a alienação pela distração. Há também a alienação pela informação tida como útil: artigos de jornais, vídeos com análises políticas, discursos sobre o fim do mundo que nunca chega: a crise constante. O que é engraçado, porque "crise" deveria ser justamente um estado de exceção. A "alienação intelectualizada" é típica dos ambientes acadêmicos e, por conhecer melhor este meio específico, posso dizer que é muito presente nos círculos politicamente à esquerda. É possível que seja muito presente nos de direita também, mas a bolha social na qual eu vivo me impede de compreender realmente o que se passa nos meios diferentes do meu - na realidade, nenhuma das pessoas politizadas muito próximas a mim tem uma posição extremamente diferente dos outros (Ou talvez tenha, mas prefira se abster de comentários com medo de que qualquer opinião constrastante tenha que enfrentar acusações. Talvez até mesmo vindas de mim - não me excluo deste meio, estou contaminada com a falta de paciência para lidar com o "oposto"). Enfim, se você não está deprimido e desesperado com a situação do país, meu amigo, taí o diagnóstico: alienado.
Não quero dizer que ler um artigo do El País vá me deixar três dias de cama com febre intensa. Mas a obsessão pela política e pelas mazelas do mundo ultrapassa a informação e beira o masoquismo. É preciso estar ligado em cada gafe do presidente para fazer piadas sobre o assunto. É preciso compartilhar todos os memes que tenham a ver com sua posição política, mesmo que eles não informem nada para quem desconheça o assunto. É imprescindível compartilhar artigos de jornal, mesmo que só tenha lido o título, ainda mais se esse título for bastante alarmista. É preciso, acima de tudo, curtir e compartilhar qualquer textão que pareça minimamente expressar o meu ponto de vista, mesmo que eu não tenha tido tempo suficiente para refletir sobre o assunto. Não há tempo para refletir sobre nenhum assunto. Meme bom é meme quente, a piada do último minuto, o textão sobre o último massacre, a reação imeditada às informações que se sobrepõem. Não precisamos que a televisão faça terrorismo psicológico, nós mesmos nos encarregamos de entrar em pânico sozinhos. E, não bastando entrar em pânico, espalhamos o pânico porque não queremos que ninguém seja "alienado".
É preciso estar informado, é preciso estar consciente dos seus direitos e lutar por eles - não pretendo discordar disto. Mas, antes de qualquer coisa, é preciso respirar. É preciso olhar em volta e enxergar o que há aqui e agora. É preciso começar fazendo pouco, no cotidiano, mudanças pequenas. É preciso exercitar a escuta e a paciência, e aceitar que nem sempre há um jeito de "ganhar" uma discussão. É preciso não comprar o discurso pronto - ou o meme pronto, o textão pronto, a "lacração" pronta. É preciso ter tempo pra pensar antes do like.

Escola.

Escola é um lugar onde você muito provavelmente vai se sentir burro.

Se for aluno, em algum momento não vai entender alguma matéria, ou não vai ter muito estímulo pra aprender as coisas - afinal, você é obrigado a estar ali e o governo obriga o professor a te passar de ano. E, na real, boa parte da matéria aprendida será inutilizada assim que a fase de vestibulares passar.

Se for professor, você vai descobrir que falar várias línguas ou acumular títulos não te prepara pra sala de aula.
Não te prepara pra não se surpreender com o dilema de um aluno que está paralisado no meio do corredor porque a sola do tênis descolou e ele tem vergonha que os outros vejam, nem para fazer algo melhor do que uma gambiarra com cola quente pra colar a sola do sapato do aluno.
Não te prepara pra resistir à tentação de cair no determinismo de "fulano é bom, ciclano não presta". Ainda mais quando a própria escola acaba determinando que o fulano que não presta não deveria continuar estudando lá.
Não te prepara pra saber que o aluno que foi expulso tem um histórico de abuso, não sabe ler nem escrever aos 14 anos e começou a vender drogas - e mesmo assim alguns dos seus colegas se sentem felizes por não precisarem mais lidar com a sua desobediência.
Não te prepara pra descobrir que há alunos com necessidades especiais "incluídos" na sala, mas sem acompanhamento especializado, e que você tem que se virar porque é sua obrigação fazer o menino aprender alguma coisa.
Não te prepara para, mesmo passando todas as manhãs e todo o fim de semana ocupada com coisas da escola, ter que ouvir que terá que preencher suas horas vagas com atividades, incluindo aos sábados, porque essa é a sua obrigação e é pra isso que você tem "horas vagas".
Não te prepara para lidar com alunos que simplesmente não se importam com sua presença na sala, e falam tão alto que sua voz é incapaz de alcançar mesmo os alunos que se sentam na frente.
Não te prepara para lidar com os alunos que querem aprender, mas te culpam pela falta de disciplina na sala, e querem a todo momento chamar o pedagogo ou o diretor porque te acham incapaz de manter a turma quieta - o que não deixa de ser verdade.
Não te prepara para explicar a mesmíssima coisa trocentas vezes para um aluno, para ao final de 50 minutos ele não ter absorvido absolutamente nada das informações que você (acha que) passou.
Não te prepara para a sensação de que qualquer coisa que você tente fazer ou falar vai dar errado. Que suas falas sempre serão interpretadas como chatice ou estresse gratuito e que qualquer tentativa de inovação será vista com indiferença pelos alunos e com pena pelos colegas.
Não te prepara para o fato de que, mesmo que muitos alunos de estressem de uma forma inacreditável, você por alguma razão acaba se afeiçoando por muitos deles, e é difícil aceitar que não é culpa sua que eles não estejam aprendendo muita coisa.
Não te prepara para a profunda indecisão entre o ficar e o sair, o trabalhar bem e o "empurrar com a barriga", o assumir a culpa e o culpar a diretora, o governo, o "sistema".
Quando decide sair, o coração dói pelos alunos; quando decide ficar, a cabeça pesa com tanto trabalho (muitas vezes ineficaz).

Enfim, escola é um lugar onde você inevitavelmente vai se sentir burro.
E se sentindo burro, com o tempo, vai descobrindo que acabou aprendendo alguma coisa.

domingo, 10 de março de 2019

Acordar

Muitas vezes me pego imaginando que, se algum dia tivesse a oportunidade, gostaria de passar um dia dentro do corpo de outra pessoa, para perceber se os outros tem sensaçoes, sentimentos e pensamentos parecidos com os meus em momentos corriqueiros do dia-a-dia. Isso seria um bom jeito de saber se eu sou alguém normal ou se as coisas que eu penso e sinto realmente são esqusitices minhas.
Um desses momentos corriqueiros que geralmente me incomodam é a hora de acordar.
Eu sei que muitas pessoas acordam de mau-humor, logo isso é "normal". Sei também que muitas não gostam de acordar cedo.
Eu não sei se definiria meu humor pela manhã como "mau", pois ele depende muito do ambiente externo também, e acho que se fosse mau-humor matutino ele aconteceria em qualquer lugar, com qualquer pessoa.
O que me incomoda na hora de despertar é que, em mais da metade das vezes, eu acordo como se estivesse saindo de uma batalha onírica: suada, agitada, com um turbilhão de preocupações na cabeça, tremendo, com um pouco de dificuldade de respirar. Sempre acordo cedo naturalmente, mas a sensação é quase sempre a de que um despertador muito alto tocou, ou que alguém me acordou com um susto. Outro tipo de sensação que me incomoda em algumas manhãs é a saudade inexplicada de pessoas com as quais eu convivo. Às vezes eu não acordo tão agitada, mas acordo sentindo falta de alguém próximo - dos meus pais ou do meu namorado, geralmente. E é uma saudade esquisita, um medo de que aconteça algo com a pessoa, e geralmente nesses momentos eu evito a todo custo ficar sozinha (o que pra mim é raro, pois geralmente eu gosto de passar um tempo comigo mesma). No geral, seja acordando com saudade ou super agitada, tenho sempre a impressão de que meus sonhos não me deixam descansar. É quase como se eu tivesse uma outra vida no mundo dos sonhos, nas quais eu tenho muita coisa pra fazer e convivo com um monte de gente, e parece que os sentimentos e preocupações destes dois mundos se conectam, fazendo com que eu esteja constantemente preocupada, mesmo quando deveria estar descansando.
Talvez por isso muitas vezes eu tenha a sensação de que dormir menos me deixa mais descansada. Quando tenho a oportunidade de dormir mais, sempre fica ainda mais difícil ter ânimo de sair da cama, parece que os sonhos não me deixam voltar pra realidade, a cabeça fica pesada e eu acordo-durmo-acordo diversas vezes antes de conseguir levantar.
Já percebi, no entanto, que quando durmo com alguém essa sensação é menos recorrente. Talvez a certeza de ter alguém para abraçar caso eu acorde assustada me deixe relaxar mais, não sei. Talvez eu seja um caso raro de gente que dorme melhor fora de casa...

sexta-feira, 8 de março de 2019

Eu não quero "parabéns".

No Dia da Consciência Negra, não vejo nenhum afrodescendente recebendo flores ou parabéns. É um dia de rememorar os sofrimentos e a luta de muitas pessoas que possibilitaram que a nossa vida na atualidade fosse melhor que a deles.
Sendo assim, no dia da Mulher, que relembra o feminicídio de diversas trabalhadoras que protestavam pelos seus direitos, não quero ser parabenizada por ser mulher. "Parabéns, você é tratada com desigualdade! Toma aqui uma flor" - É essa a sensação que eu tenho. Devemos ser parabenizadas, sim, pela nossa força diária e pela nossa luta. O problema é que a maioria das pessoas que nos parabeniza não tem isso em mente.
Recebemos parabéns por questões que reforçam o esteriótipo do lugar da mulher. Por fazer as coisas no salto alto e embonecadas. Por sermos mães e esposas cuidadosas. Por trabalharmos triplamente para lidar com a vida profissional, a organização da casa e a atenção aos maridos e filhos, carregando o "lar" nas costas porque esta é a parte que nos cabe. Por, mesmo fortes, não perdermos a "feminilidade".
O que eu quero, no lugar do parabéns, é um mundo onde eu não seja olhada com estranheza caso não queira me casar e ter filhos. Um mundo onde depilação, maquiagem e salto alto não me façam ser reconhecidas como mais ou menos feminina, porque de qualquer forma eu continuo sendo mulher. Onde eu não seja obrigada a dar sorrisinhos, ser simpática e delicada em toda e qualquer situação, para não "espantar" os homens. Um mundo onde a minha competência em algum assunto não seja previamente julgada como inferior aos homens ao meu redor: "Que legal sua camisa do Iron Maiden, me fala aí a discografia completa" ou "Ah, se você gosta de futebol, me fala a escalação da Seleção em 1970". Quero um mundo onde eu não precise pedir "ajuda" em casa ao meu companheiro, porque ele tem consciência de que a organização da casa é obrigação de todos que nela moram. Um "lar" em que eu não precise ser aquela que acompanha sozinha as reuniões de pais, as apresentações dos filhos, os deveres de casa dos meus filhos. Quero um mundo onde eu possa voltar da balada no mesmo horário dos meus amigos homens, e possa pegar um Uber ou um táxi com a certeza de que chegarei em casa sem sofrer violência. E que neste mundo, caso sofra alguma violência, a culpa não seja minha por estar com uma roupa "provocante" ou por andar na rua "a esta hora". Quero poder sair na rua com qualquer roupa e não desconfiar de cada "bom dia" que eu recebo de um homem - aliás, quero poder escolher cumprimentar ou não as pessoas de acordo com a minha vontade, sem ficar na dúvida: "se eu cumprimento sou oferecida, se eu não respondo sou mal-educada". Quero um mundo onde a meu companheiro tenha o direito de se afastar do trabalho quando nosso filho nascer, assim como poder trocar as fraldas da criança em banheiros públicos, já que isto não é uma obrigação exclusivamente minha. Para que este mundo se torne verdade é necessário, antes de tudo, que não se desvalorize as pequenas e grandes lutas das mulheres, desde uma denúncia contra um assediador no metrô até protestos em favor da igualdade salarial. Que nossas reivindicações não sejam transformadas em "mimimi". Que o feminismo seja reconhecido pela sua verdadeira natureza de igualdade, e não desacreditado como um movimento de segregação. Que eu receba parabéns por ser feminista, e não por ser "feminina", de acordo com a concepção de feminilidade que nos é imposta. Que eu receba parabéns por lutar e, pouco a pouco, vencer. Então, se você não acredita na luta feminista, se você acha que meu lugar é cuidando da casa, que eu preciso "me dar ao respeito", por favor, guarde suas flores e seu parabéns. É por um mundo sem pensamentos como o seu que eu luto.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

A falta do nada

Dolce far niente - doce fazer nada.

Fazer nada não é doce quando se tem tarefas por cumprir e nem é fácil nos dias de hoje.

Sinto falta de fazer nada, mas isso não é simplesmente ter tempo livre. Hoje em dia somos bombardeados a cada instante com informação, inclusive no ócio. Facebook e Instagram nos informam das atividades dos nossos conhecidos, ou mesmo notícias sobre política e economia. Na Netflix, sempre um monte de séries para ocupar o tempo. Jogos não faltam para quem saiba procurar. Mas nada disso é o fazer-nada que me falta.

Sinto falta de olhar para onde os olhos descansem, sem observar. De ficar sozinha com meus pensamentos, olhando a paisagem, mesmo que ela seja uma parede branca. Ficar parada até sentir algo que me é raro: o tédio. Até sentir uma vontade genuína e voluntária de me mover para fazer alguma coisa.

Parece que somos sempre obrigados, mesmo no ócio, a fazer algo. Aproveite o tempo para adiantar o trabalho! Veja séries! Leia um livro! Saia para passear! Se atualize com as notícias! Passe tempo com a família! Vá beber com os amigos!
Tudo isso é bom, mas nessa obsessão por preencher o tempo falta o vazio. Falta o fazer nada, falta deixar o pensamento vagar. E depois sentir uma vontade renovada para fazer todas as outras coisas.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Auf Deutsch.

Manchmal habe ich Angst davor, dass ich mein Deutsch im Laufe des Jahres vergessen werde. Als ich eine Beziehung mit einem Deutschen hatte, hatte ich mehr Lust, nach Deutschland umzuziehen. Ich hatte auch mehr Möglichkeiten, mein Deutsch zu üben. Jetzt habe ich das nicht mehr in Aussicht, im Ausland zu leben. Das ist ok, viele Leute sind in Brasilien geboren, waren noch nie in anderem Land und werden nie im Ausland wohnen, aber, vielleicht wegen meine (nicht so) alte Erwartungen und Planen, finde ich es ein bisschen traurig, keine Reise mehr im Horizont zu haben. Natürlich ist Geld auch ein Problem, da ich immer als Turistin reisen kann - also "kann", in Sinne von "falls ich Geld und Zeit hätte".
Die Wahrheit ist, dass ich gerade die Krise kriege. Verdammter Instagram, ich sollte dich heute nicht so viel geguckt haben. Fast immer sehe ich Bilder von Leute, die ich kenne, und sie sehen so frohlicher, so intelligenter, so freier aus, dass ich mich nerve. Und dann fühle ich mich frustriert: 27 Jahre alt und habe ich noch keinen richtigen Job, kein Geld, wohne mit meinen Eltern, habe eine Art von Käfig im Kopf: warum denke ich so viel daran, was die anderen über mich denken? Warum schaffe ich es in Brasilien nicht, mich frei zu fühlen? Warum ist das so ein Tabu, alleine Nachts nach Hause zu gehen, oder alleine wandern gehen, oder nackt sein, wenn das mir gefällt? Man könnte sagen "ah, das ist wegen die Gewalt, die in Brasilien so erschreckend ist". Ja, das Stimmt, aber das ist nicht alles. Es gibt Frauen, die freier als ich sind. Ich glaube, ich habe mehr Angst von der Meinung meiner Familie als die Gewalt. Tattoos, Piercing, Haarschnitt, neue Liebe, das kommt immer mit Tausenden Fragen: was wird meine Mutter sagen? Was wird meiner Vater denken? Welche Kommentare soll ich von meine Tante erwarten? Welche Witze von meine Onkeln?
Und es gibt immer die Frage: auch wenn ich nicht mehr in Mariana wöhnte, hätte ich nicht mehr solche Sorgen? Ich glaube, das ist alles im Kopf. Ich muss die Art und Weise meiner Gedanken ändern, aber wie macht man das? Mit Therapie? Aber dafür brauche ich auch Geld. Ach...

Okay, vielleicht sollte ich heute kein Bier getrunken haben. Ich fühle mich total nüchtern, deprimiert und kann nicht schlafen. Und die verdammte Urtikaria juckt!